Eleições 2018: que a fé seja maior que o medo

Agora são 19h e, com 88% das urnas apuradas, Bolsonaro lidera. Da janela do meu quarto, ouço fogos, muita buzina e gritos comemorando na rua. Aqui dentro, um silêncio que machuca. É como assistir a uma tragédia e não poder fazer nada. Estamos diante de um marco assustador na história recente do país. É a maior ameaça à democracia desde a ditadura. E tem muita gente feliz com isso. Não, eu não consigo entender, me desculpe a “ignorância”, como vi alguns dizendo no Facebook: “Lamentável ver pessoas tão inteligentes votando no PT.”

Bom, se sou ignorante, devo ter entendido as aulas de história errado. Neste momento, só consigo me lembrar das aulas com o professor Wellington,  já falecido, em que aprendi claramente sobre as características do fascismo, um sistema antidemocrático, em que há a crença de superioridade de alguns sobre outros, e onde nenhuma crítica ao governo pode ser tolerada. Um nacionalismo exacerbado (“Brasil acima de tudo”), a postura de heroísmo, a promessa do “sonho”, e, claro, o militarismo, são outros traços claros deste sistema.

E agora, em 2018, eu que achei que jamais veria isso acontecer no século XXI, estou presenciando a liberdade de expressão ruir, bem na minha frente. Me vem a mente também uma frase que ouvi do William Bonner, em uma palestra dele, na UFMG: “Para entendermos melhor o presente e o futuro, precisamos saber do passado. Estudem história, estudem história o máximo que puderem.” No entanto, o que está acontecendo hoje, dia 28 de outubro de 2018, me mostra que não fizemos o dever de casa. Não estudamos história tanto quanto deveríamos. Ou se estudamos, não levamos tanto a sério o genocídio dos povos indígenas, a escravidão, o holocausto, e os horrores da ditadura.

Posso estar errada, mas não me lembro de nenhuma eleição com tamanho fanatismo. Inclusive agora, vendo a comemoração, vejo as pessoas encarando algo tão sério como uma partida de futebol. Um fanatismo que cega, e muito me lembra um filme chamado “A Onda”, que mostra, através de um experimento, os pilares de uma autocracia ditatorial e fascista e a irracionalidade com que os seguidores do ‘líder’ agem.

Alguns dirão que essa comparação é um exagero, afinal o neofascismo é mais discreto, mais “velado”. No entanto, está nos detalhes e só não enxerga quem não quer ver. Bolsonaro, durante toda a sua campanha, fez um gesto que faz apologia à arma. E tem gente reproduzindo isso nas ruas! Sim, armas. Em um mundo em que já existe violência demais. Em um mundo em que a gente já vive lutando pelo amor, pela igualdade, pelo respeito, pela diversidade.

Não, não entra na minha cabeça como o desespero por mudança pode levar pessoas a elegerem um homem que já declarou abertamente que mulheres são inferiores, homossexualismo é falta de “coro”, que seus filhos não se envolveriam com negras pois são bem educados, e que já demonstrou inúmeras vezes total desrespeito com nordestinos, pobres, indígenas e quilombolas. Um homem que já disse a outra mulher, na frente das câmeras, quase a agredindo fisicamente, que ela não merece ser estuprada por ele.

Enfim, eu poderia gastar esse texto inteiro só listando as citações mais nojentas deste homem, mas não é esse meu objetivo.  Eu quero, sim, mudanças e acho que um partido há 16 anos no poder é algo totalmente contrário ao conceito de democracia, especialmente um partido que acabou tão manchado pela corrupção. Mas eu também sei que é no desespero que fazemos as piores escolhas. E o mundo que eu quero não se assemelha em NADA com este homem, agora, com as urnas 100% apuradas, Presidente do Brasil. Um homem que, durante toda sua campanha, só fugiu dos debates. E isso, para mim, já seria um único motivo para não votar nele. Um presidente que não promove o diálogo? Como terei voz para cobrar melhorias?

Quando paro e penso no fato inédito de ver partidos rivais do PT demonstrando apoio ao Haddad, consigo perceber que essa eleição não foi uma eleição comum e que o que estava em jogo vai muito além do partido A ou C. Mas, infelizmente, nem todos pensam assim. Eu ouvi, inclusive, coisas – que para mim são absurdas –  como: “Tudo bem ele ter um discurso fascista, o que importa é o que ele fará para o país”. Bom, não consigo vislumbrar o que faz dele alguém capaz de salvar o país. Eu o vejo apenas como um extremista e estrategista que soube surfar muito bem na onda no antipetismo. O que o elegeu não foi, nem de longe, sua capacidade, mas sim o desespero das pessoas para acabar com a corrupção que há anos assola nosso país. O que poucos sabem, no entanto, é que o antigo partido dele (PP), é ainda mais corrupto que o PT. Mas isso não conta, né? O que importa é “tirar o PT”, custe o que custar.

Só espero, de coração, que essa conta não seja tão alta. E apesar de ter “perdido” essa luta, tenho orgulho do lado em que eu estava, ou melhor, o lado que eu NÃO estava. Agora, só me resta elevar minhas esperanças em Deus. Prefiro acreditar que essa onda de neofascismo que assola o mundo tenha, de alguma forma, a missão de nos ensinar e nos evoluir, ainda que pela dor.

Mais ainda: eu desejo que não haja dor, apenas amor.  Desejo estar enganada sobre quase tudo que escrevi aqui e desejo ver o Brasil tendo o tão sonhado avanço que todos buscam, sem a disseminação do ódio, sem a instalação do medo, e sem ver o discurso do preconceito ainda mais materializado na atitude do povo brasileiro. Acima de tudo, desejo que nós possamos ser capazes de construir o nosso próprio futuro, com dedicação, pensamentos positivos e amor ao próximo, independente de quem lidera o país.

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