Quando a princesa cai da carruagem

 

Aconteceu. Eu achei que esse dia não chegaria, mas, sim, finalmente, ele chegou. Eu amanheci mais disposta do que havia me deitado, mais leve, mais presente, mais ‘eu’ e menos ‘zumbi’. Era como se as lágrimas que derramei no travesseiro até pegar no sono tivessem sido os seus últimos vestígios dizendo adeus. Sim. Quando me olhei no espelho, percebi: Você não era mais parte de mim. Eu havia aprendido a andar de bicicleta novamente, sem rodinhas, sem você.

Então não era mentira quando todos me diziam que isso ia passar. Não eram palavras vazias quando me disseram que eu iria te esquecer e que você era só uma das centenas de decepções que eu teria na vida. Achei esses consolos tão inúteis e óbvios, mas eu estava ali, diante do fato se concretizando, e me redimindo. Sim, era tudo verdade. Passou. E, acredite, esse texto não é uma tentativa de chamar sua atenção. Aliás, eu nem espero que você o leia.

Como eu me sinto boba pelas vezes que disse que não saberia viver sem você. É claro que sei. Eu sempre respirei normalmente antes de te conhecer e, agora, olha eu aqui de novo, de pé, inteirinha, aliás, nunca estive tão viva, tão próxima de mim mesma. Você ofuscava a minha visão, você era tão dominante na minha vida que acabei não dando a atenção necessária a mim mesma, aos meus gostos, aos meus interesses, aos meus desejos, aos meus prazeres. Você consumia muito de mim. Não te culpo. Na verdade, eu é que estou aprendendo a me amar agora.

Mas quer saber? Apesar de me achar uma ingênua, também me sinto madura, pois começo a perceber que a vida tem disso mesmo e, sim, se decepcionar faz parte da nossa existência. Faz parte esperar das pessoas mais do que elas podem nos dar, faz parte depositar confiança em excesso em quem não merece, faz parte não ser o que as pessoas querem que sejamos, faz parte ouvir e fazer promessas que nem sempre ou quase nunca são cumpridas. Palavras parecem fortes e intensas no momento em que são ditas, mas se esvaem com uma facilidade grotesca.

Estou muito bem, é bom que você saiba. Mas devo dizer que também não sou tão dura assim. Senti vontade de te ligar na semana passada, quando fui aprovada naquele concurso para o qual eu abri mão de estar com você muitas vezes para estudar. Em um final de semana desses, eu estava cansada e não tive vontade de sair e devo assumir que, por um instante, senti saudade de nossas noites de sábado em casa, com uma janta simples, um edredom e um filme.  Sabe como é, sexta-feira passada senti falta de receber aquela sua ligação após o trabalho. “E então, o que temos para hoje?”. Era bom ter uma companhia segura, que eu sabia que me acompanharia até nos piores eventos ou, melhor, que tinha o dom de transformar um evento ruim em algo único.

Mas sabe, esses relapsos já estão indo embora. Acho que eu sinto falta mesmo é de ser especial para alguém, só isso. A qualquer momento, outro vai vir e vai ocupar o lugar que um dia fora seu. O seu retrato na minha cabeceira será substituído e, adivinhe, eu vou amar de novo. Pois é, funciona assim. Os relacionamentos são voláteis e, às vezes, o amor também tem prazo de validade. Cética, eu? Nada, meu bem. Só estou aprendendo a viver.

Por Renata Stuart

2 respostas

  1. Texto muito verdadeiro.
    A gente pode amar, fazer parte da vida do outro, mas não pode esquecer de se amar, se valorizar.
    Penso como a personagem: bobagem dizer que não pode viver sem alguém. Amo muito a pessoa que está comigo agora, daria minha vida por esta pessoa com certeza, mas se um dia o encanto se desfizer e a vida nos separar, por mais que eu sofra tenho a consciência de que sobreviverei, sim!
    Por que não deixei de ser eu.
    Compartilhei e recomendei seu texto, muito bom!

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